Nestes últimos meses, pacientemente, andei a ler o fabuloso livro "A Riqueza e a Pobreza das Nações- Porque são algumas tão ricas e outras tão pobres", de David S. Landes.
Para encurtar uma longa descrição da obra à laia de contextualização, digo somente que o livro me prendeu do princípio ao fim, e que parece mais uma longa crónica escrita com estilo e ironia do que aquilo que verdadeiramente é: uma tese.
O autor, fervoroso crente nas dinâmicas do capitalismo, estimuladas, ou travadas, pela cultura de cada povo e/ou país, estabelece mais ou menos um padrão de desenvolvimento económico para várias nações. Do lado das ricas, surgem à cabeça o Reino Unido, os EUA e o Japão. Entre elas têm em comum como estímulo 'natural' ao desenvolvimento uma forte disciplina social, avidez pela tecnologia e pela novidade, e uma arreigada ética do trabalho, no caso dos anglo-saxónicos estruturada numa lógica protestante que encara o lucro como um bem divino.
Do lado dos pobres, está tudo o resto: a displicência, a desorganização, o sub-aproveitamento de recursos naturais, baixos níveis de instrução e de índices tecnológicos, fracas taxas de investimento, desorganização social, conflitos internos, enfim...
Apesar das explicações apontadas para a pobreza serem mais diversas do que para a riqueza, muitas das nações pobres analisadas por David S. Landes têm em comum o facto de serem antigas colónias de potências europeias. E o autor dedica uma considerável parte do seu texto a desmontar os argumentos daqueles que tentam actualmente explicar o atraso dos seus países com a "herança colonialista", que, em alguns casos, dizem eles, ainda se faz sentir. Nada disso, insurge-se o autor, fracos argumentos para tapar o sol com a peneira e expiar o debate das verdadeiras razões estruturais do sub-desenvolvimento que, para ele, são exclusivamente de ordem interna.
No outro dia, numa saída de copos no Bairro Alto, reencontrei uma amiga que, durante um ano, esteve a trabalhar para uma empresa multinacional em Angola. Após as novidades iniciais e o sorriso de quem viveu uma experiência marcante, o semblante começou a carregar-se-lhe. Trazia histórias arrepiantes das condições em que a dita empresa multinacional colocava os trabalhadores locais, os angolanos: salários de miséria, porque se um não trabalhar logo estará outro na fila para se submeter; condições de trabalho de uma precaridade atroz ao nível da segurança, do horário e da assistência social; até não faltou o pitoresco de refeitórios e casa-de-banho separadas para uns e outros.
É aqui que David S. Landes peca por omissão. Existe ainda, de facto, uma mentalidade empresarial neo-colonialista no ocidente, que ainda explora e abusa. Não é A razão primordial para o atraso de alguns países, mas para isso contribui um pouco. Até os próprios argumentos do autor se viram contra ele neste caso, mais que não seja porque, por exemplo no caso da indústria transformadora, ao dar melhores condições aos países estrangeiros onde investe, estará também a criar mais mercado para escoar os seus produtos.
Numa época em que, no mundo industrializado, a 'responsabilidade social' das empresas é vista como a Terceira Via da economia, estes casos parecem-me de uma hipocrisia e grosseria a toda a prova.